Intervenções da Conferência:
"Homenagem a Álvaro do Céu Oliveira"
INTERVENÇÃO de Manuela Baptista:
A intervenção versou a obra , muito interessante e bem documentada, de Álvaro Aurélio do Céu Oliveira «A Terra da Maia e as Lutas Liberais» .
O I capítulo, intitulado Antes do Desembarque, começa em 1826 com a notícia da morte de D. João VI e de todos os acontecimentos que se lhe seguiram até ao Desembarque. D. Pedro IV aporta à «Praia dos Ladrões ou da Arnosa de Pampelido», tema do II capítulo, onde são descritos s lendários e bem conhecidos episódios da passagem do Rei-soldado pela Maia: o repasto das fanecas, o repouso na casa de Manuel Andrade e a veneração pela cadeira onde « D. Pedro se sentou para dar beija-mão depois de desembarcar ».Todos estes passos são documentados com transcrições de textos de diferentes autores. Tem também fotografias da casa onde dormiu D. Pedro. O III capítulo trata da entrada no Porto – Depois do Desembarque - e o IV é sobre O Cerco - do absolutismo à Convenção de Évora – Monte, bem como ao reconhecimento de Dona Maria II como Rainha de Portugal pela freguesia de Santa Eulália da Aveleda, a primeira, na Maia, a tomar essa posição. O autor não deixa de salientar que houve sempre maiatos presentes nas lutas pelo liberalismo.
O V capítulo – A Memória – descreve, com pormenores notáveis, a cerimónia do lançamento da primeira pedra do monumento destinado a perpetuar o desembarque das tropas liberais em Pampelido (Lavra).
A completar fica o relato do grande esplendor que revestiu as comemorações do centenário dessa efeméride. A descrição é pormenorizada e bem documentada.
Foi, no entanto, o VI e último capítulo- O Preço da Guerra – que me despertou mais interesse. Entendo que valoriza a obra.
As agressões e os roubos foram muitos e, por isso, melhor se fica a perceber a actuação dos contendores. Escusado será dizer que as perdas humanas e materiais foram enormes.
Álvaro do Céu Oliveira compilou documentação relevante do registo das queixas apresentadas pelos maiatos de todo o concelho, referindo na sua obra os autos de liquidação de perdas, alguns deles com significativo desenvolvimento. Mostra, atendendo à residência dos queixosos, quem mais sofreu com a guerra.
Foi referido o caso do assalto à bateria do Covelo que povo registou o acontecimento numa canção popular que os presentes puderam ouvir.
Álvaro Aurélio do Céu Oliveira termina com um elogio a Augusto Simões familiar do secretário da Comissão Liquidatária de Perdas e Danos que assinou os pedidos de indemnização.
Manuela Baptista
INTERVENÇÃO de Adalberto Costa:
“A Transferência da Sede do Concelho”
Homenagear um autor é primeiro de tudo reconhecer a sua obra como resultado de um esforço voluntário de captação de uma realidade histórica; passada, presente ou futura. O Clube UNESCO da Maia, procurou na realidade maiata um autor, agora o Aurélio do Céu Oliveira e de entre os seus trabalhos de história local/regional “A transferência da sede do concelho”.
Pode dizer-se que, ao contrário dos demais, este texto de Álvaro Oliveira não tem sumário ou índice, é apenas, segundo o autor uma “Nota preambular” que se inicia e termina. Um só texto com as suas descrições e a sua narrativa, fiel contudo às fontes, sem crítica histórica, mas com cariz romanceado dos comportamentos dos homens de finais do séc. XIX que dinamizaram a política da Maia. O texto da “Transferência da sede do concelho” é em si mesmo e em nossa opinião uma fonte de investigação com elementos e pistas reais que ajudam à história – como diz Marc Bloc.
É interessante a referência feita pelo autor à Assembleia Recreativa da Maia, vista como um centro de cultura, de educação, e porque não de ciência humana regional cuja existência ajuda ao conhecimento da Maia, do seu concelho e da antiga “Terra da Maia”. O melindre da mudança da sede do concelho, isto é, da mudança dos Paços do Concelho inicia-se, segundo o autor, em 1860 e pela acção do então Administrador do Concelho, o bacharel António Francisco Cabral (?). A questão estava nas instalações dos serviços do administrador do concelho, então sediados no Picôto, em S. Miguel de Barreiros, levantando-se o problema do cumprimento da lei, concretamente do que dispunha o Código Administrativo em vigor - Código Administrativo de 1842, que no artigo 128º nº 4 dizia que é obrigação da câmara, «dar acomodação para a secretaria da administração do concelho nos Paços do mesmo, ou fornecer outro local conveniente se ali o não houver.»
Da questão assim suscitada, surgiram várias opiniões e por isso vários partidos, uns que queriam os serviços do administrador no Picoto, outros que opinavam que tais serviços deviam estabelecer-se no Castelo, Santa Maria de Avioso. O Código Administrativo, porém, dizia que tais serviços deviam ficar junto dos Paços do Concelho e estes estavam no Picoto, logo afastados dos Paços do Concelho. Desta contenda interpretativa, mas também de reclamação do Administrador acabou com os serviços a funcionar em Barreiros/Picoto.
Até finais de 1866, a questão serenou. Mas esta serenidade não deixou de criar uma forte cisão entre Barreiros e o Castelo tendo por conta os serviços das magistraturas do concelho e da sua localização.
E é o Governador Civil do Porto – Barão de S. Januário - que em outubro de 1866 vem à Maia incendiar a questão da localização dos serviços do Administrador, fazendo-o em reunião da câmara a que assistiu, sugerindo nessa mesma reunião camarária que se construísse uma nova casa para a câmara e os seus serviços no Picoto/Barreiros.
Daqui para diante, até o horário de início das sessões da câmara eram motivo para que os de Barreiros fizessem oposição e argumentassem a mudança da sede do concelho do Castelo para o Picoto.
Não fora isso, também o local da realização das audiências judiciais que, parece, se realizavam já há algum tempo em Vermoim, na Quinta Nova ou Quinta Amarela, eram motivo para os que defendiam a mudança dos Paços do Concelho para o Picoto.
Em 1868, dois anos depois, em reunião da câmara, voltava o problema da mudança da sede do concelho a ser aflorado e mais uma vez as tricas políticas entre os do Castelo e os do Picoto vieram ao de cima, vindo agora os de fora, principalmente os de Águas Santas, aliar-se aos de Barreiros.
Em 1870 era Presidente da câmara Joaquim Moutinho dos Santos e, no dia seguinte ao da sua tomada de posse e da câmara, «a secretaria da câmara recebia um abaixo-assinado solicitando ao governador civil do Porto, a centralização dos serviços municipais no Castelo».
Diga-se que os serviços andavam dispersos pelo Castelo e pelo Picoto. No Picoto estavam o administrador do concelho, a Fazenda Pública e a Recebedoria (espécie de Tesouraria da Fazenda Pública).
Mas, logo um mês depois, nova solicitação é apresentada ao governador civil, apelando à centralização dos serviços municipais no Castelo, estando esta subscrita por pessoas que desconheciam o teor do documento que assinaram. O documento fora assinado por Ex criados de servir e alunos da Escola do Professor do Castelo, Joaquim da Costa Leite. A pressão era o modo que as forças políticas em disputa tinham para dar força às suas pretensões.
De entre promessas de disponibilidade de casas no Castelo, à real centralidade do Picoto, a luta entre os partidários estava ao rubro.
A 8 de agosto de 1870 com a discussão do orçamento da câmara, o presidente pretendia aprovar no orçamento uma verba para a construção do cemitério no Castelo e a instalação dos Paços do Concelho na freguesia de Vermoim (S. Romão), por se entender que era aqui o coração do concelho. Esta possibilidade orçamentada não chegou a ser aprovada.
Em reunião de câmara de 12 de junho de 1871 é apresentada uma proposta para a mudança dos paços do concelho para o Picoto com o argumento de que aí havia casa para a câmara e que era oferecida, portanto, sem custos para o erário municipal. A proposta é aprovada e os paços do concelho mudavam-se para o Picoto. Mas, neste confronto entre castelenses e os do Picoto, havia sempre um mas, eis que a câmara solícita ao governo autorização para que a mudança fosse efetivamente concretizada. O Governo, por Portaria de 19 de junho de 1871, não autoriza aquela mudança, alegando em suma que o governo não tem competência para o efeito, devendo antes a câmara submeter o assunto ao órgão legislativo do concelho para a provação.
Na reunião de câmara de 17 de julho de 1871 é lido um abaixo-assinado de 18 folhas, que reclama a manutenção da sede do concelho no Castelo. Vicissitudes várias, descritas pelo Álvaro Oliveira, os projetos de uns e de outros ficaram sem efeito, não sem que o nosso autor nos tenha deixado dito: «trocaram-se palavras ásperas, choveram as injúrias e cresceram as ameaças. Ainda hoje ninguém sabe explicar por que carga de água a vereação não chegou às vias de facto. Talvez o milagre de Santo Ovídio».
A 2 de janeiro de 1872, José Vitorino é escolhido para presidente da edilidade por aclamação. Este homem tinha uma proposta aprovada pela câmara - a de um orçamento para aumento dos Paços do Concelho no Castelo em ordem a que o mesmo pudesse acomodar todas as repartições públicas do concelho. Claro que os opositores sempre se insurgiram contra tal aprovação, mostrando resistência a tal aprovação. As freguesias do concelho estavam desavindas, e Águas Santas procurou passar para Valongo, mas as obras de ampliação da casa da câmara no Castelo avançaram e por fases.
Em 6 de março de 1881, aparece na câmara um pedido de certidão de onde constasse o interesse do município na instalação no Picoto de uma estação dos correios. Este documento foi subscrito por Acácio Alberto Morais Lobo, residente em Barreiros. Era presidente da câmara António Moreira do Couto e este reconheceu o interesse de tal posto no concelho. Tratava-se de uma armadilha dos de Barreiros para vencerem os do Castelo, pois o posto dos correios em Barreiros era sinal de centralidade.
Em 22 de agosto de 1900 era presidente António Francisco da Silva, cujo mandato seguiu até 31 de dezembro de 1901, sendo substituído no cargo a 2 de janeiro de 1902 pelo Padre José Tavares da Silva Borges, então pároco de Vila Nova da Telha. A informação e a contra-informação trocada no terreno e nos órgãos da comunicação social do tempo: Jornal de Notícias; A Voz Pública; O Norte; O Dia, a Luta de Bouças; O Primeiro de Janeiro, etc., sobe a tensão para as teses de mudança ou não dos Paços do Concelho para o Picoto em S. Miguel de Barreiros e os ânimos serram-se. A movimentação política entre os do Castelo e os de Barreiros foi forte, mas os Paços do Concelho passaram efetivamente para o lugar do Picoto em Barreiros. Pelo Decreto nº 143, de 1902, assinado a 28 de junho, autorizou o governo a que os Paços do Concelho da Maia se mudasse do lugar do Castelo, freguesia de Santa Maria de Avioso, para o lugar do Picoto, freguesia de S. Miguel de Barreiros.
Era monarquia, e ministro, Ernesto Rodolfo Hintze Ribeiro.
Adalberto Costa