-
Alfabetismo e abandono escolar
Alfabetização e ensino durante e depois da crise do Covid-19 à luz do objetivo 4ºda agenda 2030 da ONU e Unesco.
Objetivos principais Melhorar a compreensão do impacto da crise do Covid-19 sobre o ensino e aprendizagem da alfabetização dos jovens e adultos bem como dos educadores.
Sensibilizar para a necessidade de reforçar a ligação aos educadores e à sua profissionalização na promoção da alfabetização dos jovens e adultos, tendo em vista a realização do artigo 4º da Agenda 2030 na sua totalidade.
Produzir e partilhar novos conhecimentos ligados aos educadores e seu desempenho, à formação inicial e contínua e aos métodos de ensino e suas pedagogias.
Assegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos.
Estas alíneas têm cabimento no Objetivo 4 da Agenda 2030 da ONU de que vamos referir alguns itens:
Garantir que todas os meninos e meninas completem o ensino primário e secundário que conduza a resultados de aprendizagem relevantes e eficazes e com acesso a um desenvolvimento de qualidade na primeira infância, cuidados e educação pré-escolar, de modo que estejam prontos para o ensino primário. Assegurar a igualdade de acesso para todos os homens e mulheres à educação técnica, profissional e superior de qualidade, a preços acessíveis, incluindo universidade e adquiram conhecimentos e habilidades necessárias para promover o desenvolvimento sustentável, inclusive, entre outros, por meio da educação para os estilos de vida, direitos humanos, igualdade de gênero, promoção de uma cultura de paz e não violência, cidadania global e valorização da diversidade cultural e da contribuição da cultura.
A UNESCO no seu acto constitutivo de 16 de novembro de 1945 considera inquestionável a declaração de todos os estados signatários, segundo a qual se garante a todos o pleno e igual acesso à educação e à livre permuta das ideias e dos conhecimentos.
Definia-se assim a nível político e universal o que muitos estados já tinham consignado nas suas Constituições.Com o propósito de fomentar a alfabetização nos vários países, a Organização das Nações Unidas (ONU) e a UNESCO instituíram a data de 8 de setembro em 1967para realçar a Universalidade da Alfabetização.
O processo da aprendizagem de ler e escrever (alfabetização) está diretamente relacionado com o desenvolvimento de um país, conforme indicam pesquisas na área. Quanto mais pessoas analfabetas, menor é o índice de desenvolvimento.
Por esse motivo, nas últimas décadas vários países têm assumido o compromisso de combater o analfabetismo.
Atualmente, a alfabetização atinge cerca de 85% da população mundial, de acordo com dados da ONU.No entanto, estima-se que ainda existem quase 800 milhões de adultos que não sabem ler, escrever ou contar, e aproximadamente 250 milhões de crianças consideradas analfabetas funcionais (não conseguem interpretar os textos).
O objetivo não é apenas alfabetizar, mas fazer com que os jovens e adultos saibam interpretar um texto criticamente e que desenvolvam o prazer da leitura.
Claro que a alfabetização deve ser a porta aberta para a educação permanente e a educação para todos e para toda a vida. (Jacques Delors, Edições Unesco) enfatizando os 4 pilares educativo de que falaremos mais adiante.
Consideremos ab ovo os seguintes itens:
O advento da escola
Comunicação.
Importância da Educação
Educação para todos e para toda a vida.Uma visão histórica-semântica da escola Etimologicamente escola (σχολη) significa o prazer resultante da actio contemplativa que pressupõe um universo considerado como κοσμοσ ou mundus cujo antónimo é immundus.
Posteriormente a escola torna-se sinónimo de lição e, por metonímia, o lugar onde se processa a lição. σχολη relaciona-se com o otium, ou seja, com o lazer, isto é, com as classes sociais que tinham classes de trabalhadores a trabalharem para si.
Por isso fazer escola (σχολην αγειν) é sinónimo de não trabalhar nas atividades dos bens de consumo. Ainda hoje, para muitos, estudar não é trabalhar.
Quer nos centremos no conceito de que a palavra educação provém do étimo latino educare que significa dirigir, conduzir, semanticamente relacionado com pedagogo (aquele que conduz, orienta o menino, ou seja, o aluno),
Quer se admita que o étimo provém de educere, ou seja tirar de dentro para fora, trata-se também de uma viagem que começa no sujeito e nele termina. É um tipo diferente de ensino a chamada Escola Nova em que se acentua o processo de aprendizagem mais que os seus conceitos.
Não vamos teorizar sobre estas questões, mas devemos ter presente que a Escola Tradicional trabalha ainda para reproduzir a sociedade existente, quando ela muda muito rapidamente. Isto significa que muito do que se ensina na escola não tem aplicação na sociedade actual, ou seja, não há isomorfismo entre o currículo escolar e o mundo social incluindo o laboral.
É, pois, função da educação ser permanente, preparando os alunos para um futuro que ainda não existe. Daí o considerarmos que a educação tem de aliar-se à tecnologia, à inovação e ao universo do conhecimento.
Sistematização da escola Houve ao longo dos tempos etapas decisivas na criação, ordenação e implementação da escola como membro de um sistema nacional de Educação. Vamos considerar alguns dados considerados relevantes.
O curriculum “Dentes de Sabre” mostra como as aprendizagens deixam de corresponder às necessidades reais e como estas obrigam a mudar aquelas.
O curriculum “Dentes de Sabre” é uma sátira muito relevante extraída de Benjamin,H. (1977). The curriculum: context, design and development. Edinburgh.Revela-se como e quem construiu o primeiro currículo escolar, tendo por fundamento o imperativo de responder às necessidades de sobrevivência da tribo, construindo e ensinando a construir três armas de caça muito importantes para a sobrevivência de todos.
Depois de muitas resistências dos religiosos que argumentavam que se o Grande Mistério quisesse que as crianças praticassem as três disciplinas em vez do adulto ter-lhes ia dado dotes inatos para a sua aprendizagem e por isso não precisavam de ensino
Com o tempo, porém, o currículo foi aceite, mas também com o tempo as circunstâncias alteram-se significativamente a tal ponto que o currículo escolar se tornou perfeitamente inútil para a vida da tribo.
A sociedade ou os mais dotados da mesma propuseram o ensino de práticas que eram utilizadas, mas não faziam parte do currículo escolar.
Aqui a luta foi dos intelectuais, segundo os quais a educação é eterna e por isso nada muda. A escola não tem nada que ensinar a sociedade no âmbito do trabalho.
Dicotomia que tem aparecido ao longo do tempo e mesmo nos dias de hoje.
Novo Punho viu admitido como currículo da escola a Apanha de Peixe À mão, a Cacetada nos cavalos Peludos e o Afugentamento de Dentes de Sabre pelo fogo contra a vertente religiosa.
Mais tarde, alteração do meio ambiente forçaram alterações do currículo para garantir a sobrevivência da tribo. Aí os intelectuais opuseram-se.
Tem sido sempre assim e continua a ser. É que o currículo é a mola real do ensino com forte propensão para a estabilidade.Comunicação A história da comunicação é cumulativa: cada nova linguagem, cada novo medium que Emerec criou no decurso dos tempos, juntou-se aos outros, aumentando assim a sua capacidade de comunicação. ( Jean Cloutier, A Era de Emerec, Instituto de tecnologia Educativa, Lisboa 10-21).
No entanto, longa é a evolução e o acesso a um novo modo de comunicação é difícil e trabalhoso, pois é bem verdade que cada um deles transforma progressivamente Emerec.
Desde que o homem adquiriu a linguagem, ele próprio determinou as modalidades da sua evolução biológica, sem disso ter, necessariamente, consciência. O que era verdade para a linguagem verbal era verdade para todas as outras formas de linguagem dificultando a entrada na aldeia planetária de Mac Luhan, hoje muito pertinente em tempos de Corona Vírus.
Segundo Jean Cloutier, há vários tipos de linguagem, vários episódios que devemos indicar, dada a sua importância na educação e nos vários tipos de escola.
Define um paradigma de comunicação com 4 episódios determinantes na história da educação.
A) Comunicação interpessoal, in praesentia a que corresponde a educação baseada na exteriorização. Esta comunicação em presença é importantíssima como se vê e sente em tempos de corona vírus As aulas presenciais.
B) Comunicação de elite, ou seja, das linguagens de transposição, como o desenho, o ritmo, a música e sobretudo a escrita. a que corresponde a educação de elite. É a amplificação que começa com a imprensa e se desenvolve até ao satélite.
C) Comunicação individual com o desenvolvimento, a técnica moderna permite a todos o acesso à gravação de sons e de imagens acessíveis a todos, fornecendo ao homem novas linguagens, e novos media tornando-se individuais. São os chamados self-media. O homem passa a ser o ponto de partida e de chegada da comunicação. Ele deixa de ser informado e passa a informar e a informar-se.
D) Emergência do alfabeto e por isso a do analfabeto. Os que sabem ler, escrever e somar e os outros e a longa luta para que todos possam aprender. A escola de massas.A enorme importância da educação A educação tem papel fundamental no desenvolvimento das pessoas e das sociedades Alguns dados que caracterizam os tempos modernos, ou seja, o nosso tempo.
Quem ensina?
Ensinar é uma arte e uma ciência. O processo pedagógico é uma relação entre o professor e o aluno que exige a definição clara do estatuto de cada um dos intervenientes melhorar as condições de trabalho do pessoal docente com profissionalismo, competência e dedicação.
Ensinar o quê?
Conteúdos, mundialização, globalização. Há competição entre os conteúdos escolares e os da comunicação social.
Quem aprende?
Há alunos que passam mais horas em frente à tv. que na escola. Relevar o estatuto do aluno bem como o do professor pois eles são as pedras angulares de todo o sucesso educativo.
Aprender o quê?
Em primeiro lugar, aprender a conhecer.É o ponto de partida da educação, tendo como modelo v.g. a taxonomia de Bloom (memorização, compreensão, aplicação análise, síntese e avaliação). Mas, tendo em conta as rápidas alterações provocadas pelo progresso científico e as novas formas de atividade económica e social, há que conciliar uma cultura geral suficientemente vasta, com a possibilidade de dominar, profundamente, um reduzido número de assuntos.
Esta cultura geral constitui, de certa maneira, o passaporte para uma educação permanente, na medida em que fornece o gosto e as bases para a aprendizagem ao longo de toda a vida. Aprendizagem para rapazes e raparigas, abertura de conhecimentos para outras linguagens.
Em segundo lugar, aprender a fazer consiste essencialmente em aplicar na prática os seus conhecimentos teóricos e saber comunicá-los.
Em 3º lugar aprender a viver com os outros. É um dos maiores desafios do educador já que se insere na área das atitudes e dos valores. Abrange o combate aos conflitos, aos preconceitos, à rivalidade, às lutas na escola entre alunos. É o veículo da paz, a participação nos projetos comuns, o conhecimento do outro. É a educação como veículo da paz (um dos paradigmas da Unesco).
Em 4º lugar aprender a ser Este é o tema dominante do relatório Edgar Faure, publicado em 1972 sob os auspícios da UNESCO. A educação deve ter como finalidade o desenvolvimento total do indivíduo, visa o seu desenvolvimento individual, a busca da sua autonomia, os valores, os sentimentos, a liberdade de pensamento. viver consigo mesmo e em segundo lugar com a sociedade, os quatro tipos fundamentais de educação.Aprender a ser Homem, a ser si próprio e, finalmente, a ser feliz são as metas deste pilar na vida de cada indivíduo. Educação para todos
Todo o indivíduo deve ter a possibilidade de aprender a vida inteira. A ideia de educação permanente é a pedra angular da cidade educativa e do texto “Aprender a Ser”.
Um sistema educativo global e aberto facilita a mobilidade horizontal e vertical dos alunos e multiplica as possibilidades de escolha.
Educação para toda a vida. Educação para todos, para a cidadania, para a arte e para a saúde.
Educação e inovação. A cidade educativa.
Educação versus novos conteúdos.
A educação e formação contínua. Não há formação que valha para toda a vida, na medida em que o que hoje é verdade, amanhã pode não ser.Tensão da Aldeia Global e saber viver.
A concluir o presente trabalho gostaria de relevar quão difícil é o processo educativo num mundo em trabalhos de globalização.
Tensão entre o mundial, o regional e o local. Tensão entre o universal e o particular.
Tensão entre a tradição e a modernidade. Tensão entre o longo e o curto prazo. Tensão entre competência e igualdade de oportunidades.
Tensão entre o material e o espiritual. Tensão entre o avanço explosivo dos novos conhecimentos e a capacidade humana de os assimilar. (Delors)Raul da Cunha e Silva
-
Biblia
Quem ler a Bíblia, livro de uma extraordinária beleza, se não conhecer a História das Religiões e da Civilização em geral, corre sério risco de fazer afirmações que relevam de grande desconhecimento. Bíblia é o plural da palavra grega biblion que significa livro. Bíblia são, pois, os livros, ou seja, uma coleção de 73 que exprimem o conjunto de textos reconhecidos como canónicos, isto é, oficiais.
Segundo o concílio de Trento, a Bíblia consta de 73 livros sendo 46 do Antigo Testamento que narram a história da humanidade antes de Cristo e 27 do Novo Testamento que referem a doutrina Cristã
Podemos afirmar que a Bíblia exprime mitos, lendas, histórias, sagas, textos que têm gerado polémicas, mesmo quando são um epifenómeno da ignorância. No texto que estamos a construir devemos partir de alguns princípios que penso universais.na medida em que configuram uma religião cósmica que é paradigma de todas as outras.
Em primeiro lugar, existem várias religiões no mundo e os fiéis que as seguem pensam em Deus, nas suas leis religiosas e morais e no Além.
Em segundo lugar, as doutrinas, os conceitos, os nomes partem de realidades concretas que servem de metáforas para as realidades metafísicas e religiosas e, por isso, invisíveis.
Em terceiro lugar e referindo-nos à Bíblia, o Deus bíblico tem vários nomes: Desde logo, o primeiro inscrito no primeiro versículo do Génesis, “No princípio criou Eloim o céu e a terra” (Eloim é um plural e à letra significa os deuses). Para os judeus Eloim é o Deus todo-poderoso que criou tudo quanto existe.
O célebre tetragrama (IAVÉ) que significa eu sou o que sou, Deus. Eu sou Iavé (Êxodo, 3.14). Se quisermos, é Deus sem nome nem imagem. Os judeus, como de resto os semitas não admitiam nem imagem nem nome de Deus.
Esta pluralidade bíblica dos nomes de Deus demonstra que os poderes, qualidades do Deus dos judeus são influência dos deuses dos vizinhos Cananeus e, em geral, dos povos da Mesopotâmia. Não devemos ignorar que na Bíblia há conceitos de deus idênticos aos reis do tempo.
Os textos bíblicos do Velho Testamento, como, de resto, os textos sagrados das grandes religiões referem e relatam doutrinas e acontecimentos ditados pela consciência humana, pelas necessidades de compreender os mistérios da vida, de interpretar a vontade dos governantes do mundo ou de discordar, admitindo também a possibilidade e o facto de manifestações divinas, usando, nem sempre, uma linguagem que os homens possam compreender. É neste contexto que devemos perceber a Criação do mundo referida no Génesis, segundo a qual, quando Deus, depois de criar tudo, descansou (como se Deus precisasse de descansar); o Dilúvio que nem sequer é original na Bíblia (Gilgamesh, muito antes de Moisés, descreve-o); o código de Hamurabi, ou seja, o conjunto de leis deste rei sumério.
A Bíblia é, como dissemos, o livro dos livros, o livro mais lido do mundo, uma imagem dos tempos primordiais, das transformações do Médio Oriente. Refere tempos do advento da escrita, da passagem e do triunfo da agricultura sobre a pastorícia e recoleção, da alternância de reis “democratas”, como Ciro, rei dos Persas, ou sanguinários como Herodes, rei dos Hebreus.
Foi neste espaço que ocorreram as grandes transformações da humanidade, de que vale a pena referir a história de Abel e de Caim. Um era agricultor (Caim), outro pastor (Abel). Mais que uma história de dois irmãos, e para além das explicações religiosas, segundo as quais este é o primeiro crime cometido por um irmão, a verdade é que também no Médio Oriente se processou a passagem do sistema pastoril e de recolectores para o sedentarismo agrícola.
A dureza das transformações ocorridas na mudança dos paradigmas analisados não podia ser mais realista que o símbolo da luta mortal entre dois irmãos.
Raul da Cunha e Silva
-
Continuidade Escolar
O mundo atravessa um momento muito grave de pandemia, seja na área da saúde, da economia, da convivência social, familiar, seja na educação.
Tendo presente o balanço dos esforços realizados no século XX para aumentar as possibilidades de instrução e o enorme esforço para combater o analfabetismo e a desigualdade de género, defendendo que, sem educação, o homem é um dos seres mais desprotegidos da natureza, a Unesco move montanhas para manter o valor da educação e o combate ao analfabetismo.
Daí a relevância de tornarmos público aos associados e amigos do clube textos da Divulgação da Rede de Clubes UNESCO:
“Desde o encerramento das escolas para conter a pandemia, os governos implementaram soluções de ensino à distância e abordaram as complexidades do ensino virtual, desde o fornecimento de conteúdos ao apoio aos professores, orientação familiar e resolução de problemas relacionados com a conetividade. A equidade é a principal preocupação, uma vez que o encerramento das escolas afeta de forma desproporcional os alunos vulneráveis e desfavorecidos que dependem da escola para um conjunto de serviços sociais, nomeadamente em matéria de saúde e alimentação.
“Precisamos de acelerar formas de partilhar a nossa experiência e ajudar os mais vulneráveis, quer tenham ou não acesso à Internet", afirmou a atriz Angelina Jolie, Enviada Especial do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) que se associou à UNESCO na criação da Coligação.
A Secretária-Geral adjunta da ONU, Amina Mohamed, expressou o total compromisso das Nações Unidas para com a Coligação, alertando que "para milhões de crianças e jovens de meios desfavorecidos, o encerramento das escolas pode significar a perda de uma rede de segurança vital, de nutrição, proteção e apoio emocional". E acrescentou: "Este não é o momento para aprofundar as desigualdades. Este é o momento para investir no poder transformador da educação”.
Juntaram-se à Coligação parceiros multilaterais como o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), Organização Internacional do Trabalho (OIT), Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Organização Mundial da Saúde (OMS), Programa Mundial da Alimentação (PMA), União Internacional de Telecomunicações (UIT), Banco Mundial, Organização para a Cooperação, ou seja, a fina flor em luta pela educação contra a pandemia.
Nunca tanto expressou, em tão poucas palavras, uma realidade a todos os títulos tão complexa.
Raul da Cunha e Silva
-
Cultura Clássica
Sociedade de estudos Latinos, prestigiosa entidade espanhola com a qual a Associação CLENARDVS estabeleceu recentemente uma parceria, está a recolher assinaturas para apoiar a internacionalização do processo de candidatura à UNESCO, a fim de que o Grego, o Latim e a Cultura Clássica sejam declarados património cultural imaterial da humanidade.
Pedido muito oportuno e não temos dúvida de que o Grego, o Latim e a Cultura Clássica merecem o estatuto de património cultural imaterial da humanidade. Juntamente com o judaísmo eles são os pilares constitutivos do que consideramos como Europa, a saber:
1ºAtenas ou a cultura grega. O milagre grego.
2º Roma ou a língua e a administração romana. O milagre romano.
3º Jerusalém, ou seja, a religião judaico-cristã. O milagre judaico.
É sobre estes três milagres, assim definidos por E. Renan (1823-1890) que se alicerçam a cultura e a civilização do Ocidente em vias de se tornarem mundiais.
Analisemos sumariamente cada um deles.
Importância da Literatura e da Civilização grega Na Grécia criaram-se as formas da poesia, como a Epopeia e a Lírica, a Tragédia e a Comédia, as raízes de todas as ciências que ainda hoje conservam nomes e terminologia gregos. Na Grécia nasceu a Filosofia, a História, a Geografia, a Matemática, a Medicina, a Oratória A isto com Renan chamamos o milagre grego com os seguintes indicadores: Na literatura a criação de todos ou quase todos os géneros literários com as formas e as leis que os têm regido até aos nossos dias; Na arte, a novidade, a harmonia, o ritmo, o equilíbrio, a evolução natural dos seus estilos; Na ciência, sobretudo, de início ligada à filosofia, pelo espantoso poder de observação e raciocínio que demonstram, unindo habitualmente o logon didonai (Dar razão) e o sozein ta phainomena(salvar os fenómenos); Nas conceções políticas e jurídicas cuja origem verdadeiramente racional remonta aos gregos (História da Cultura Clássica,Lisboa,1967 p168). Na religião, embora os gregos não tivessem os deuses que mereciam, construíram os mais belos mitos divinos, consignados no Céu, na Terra e nos infernos.
Importância da língua grega Segundo a Gramática Comparativa de Franz Bopp (1791-1867) quase todas as línguas europeias, como o Grego, Latim Celta, Germânico, médio-orientais como o Sânscrito, o Persa provém de uma única fonte: o Indo-Europeu.
O Indo-Europeu foi reconstruído teoricamente por linguistas, a partir da comparação das línguas cuja existência pôde ser certificada.
Verificaram-se, assim, tantas semelhanças entre línguas europeias e asiáticas, que dificilmente se admitiria serem obra do acaso.
Por exemplo, em latim, de onde provêm as línguas românicas como o português, mãe era mater; em gótico - a mais antiga língua germânica de existência comprovada - era mothar; em irlandês arcaico (língua céltica), mathir; na antiga língua da Índia, matar.Todas elas eram flexionadas, ou seja, sintéticas atente-se no seguinte quadro:
E com as línguas os seus grandes mitos ou mitemas e dados culturais.
A língua grega ocupa um lugar importante na história - O cânone da literatura grega antiga inclui obras, como os poemas épicos. Grega é também a língua em que muitos dos textos fundamentais da ciência, especialmente a astronomia, matemática e lógica, os diálogos platónicos, as obras de Aristóteles; o Novo testamento dos cristãos escrito em grego Koiné.
Entre as línguas da família indo-europeia, o grego aparece isolado.
Apresenta as particularidades comuns com várias outras línguas indo-europeias, mas os grupos de que faz parte variam para cada caso.
É por isso que ele tanto concorda com o latim, o celta ou o germânico, como com o arménio ou o indo-iraniano. Nunca formou um grupo greco-latino (E Fleury pag. 9-10).Influência dos gregos nos romanos Graecia capta ferum victorem cepit et artes intulit agresti Latio (Horácio)
Foram os Gregos quem fez passar os Romanos de um predomínio da mentalidade arcaica a um certo domínio da mentalidade racional; foram eles quem lhes abriu o espírito para perspetivas de verdadeira universalidade; foram eles quem lhes possibilitou a criação de uma alma para o império; foram eles quem, no domínio das ideias, das formas e dos gostos, na mitologia como na culinária, na eloquência como na poesia, na arquitetura como na escultura e na pintura, na filosofia como na medicina, na história como na filologia(…). Uma certa inspiração grega faz-se sentir no direito, na sátira, na educação, nas teorias políticas, mesmo na própria ideia de estado universal, na conceção da Humanitas de Cícero -a maior originalidade filosófica dos romanos.
Cultura Romana e Importância do latim O latim era língua de pastores e de agricultores como se revela nos nomes próprios. Ex. Marcus, Decimus, Quintus, Ovidius, Asinius, Cícero, Caesar. E nos nomes comuns, como pecunia derivado de pecu cabeça de gado,optimus de haveres rivalis de rivus rio, putare podar,julgar,Turim de taurus, Itália de vitélio. O mesmo princípio encontramos na literatura, na arte, na religião, no amor da Terra, da Pátria, no direito, no amor da Humanitas, da Ratio e na organização social e política.
O milagre latino é essencialmente um milagre de organização e de mediação.
A organização fundada no génio romano constituído pelo imperium, provincia potestas, majestas.
Imperium é o poder soberano, a faculdade de mandar, de fixar todas as medidas necessárias. A partir de Augusto Imperium é domínio império, reino.
Provincia é a esfera de competência de um alto magistrado fora de Roma e posteriormente o território onde o magistrado exercia o seu poder.
Potestas é o poder político como obreiro e organizador do opus ingens.
Majestas designa a grandeza, a dignidade, dos deuses e do povo romano.A Mediação é a assimilação de costumes, leis, instituições artes, técnicas, ideias e formas de diversíssimos povos sobretudo dos gregos.
Os romanos transmitiram ao mundo um legado rico a que com Renan chamamos milagre romano difundido pelo latim que, segundo J W. Mackail constitui a base necessária de metade do pensamento humano. (Cultura Clássica p.171)
A importância do latim Sendo a mãe das línguas novilatinas como o português, francês e as outras, os falantes novilatinos podem considerar o latim como segunda língua materna.
Vem a propósito trazer à colação os valores primordiais dos latinos consignados na expressão Mos Majorum. Bem analisada in Ab Urbe Condita de Tito Lívio (sec.1ºAntes de Cristo) cuja essência vamos considerar.
Mos majorum constitui preceitos normativos reconhecidos por toda a comunidade, obrigada a respeitá-los. São um código não escrito de leis e de conduta com os seguintes fundamentos:
Fides (boa fé, lealdade)
pietas A atitude de forte respeito aos deuses, à pátria, aos pais e à família.
Majestas Superioridade natural do cidadão romano
Virtus derivada de vir constituía o ideal de um verdadeiro varão romano
Gravitas Autodomínio, autoridade e dignidade.
Constantia Estabilidade nas suas decisões
Frugalitas frugalidade, temperança, modéstia
Finalmente a tradição e a evolução romana encontram uma clara expressão num edito dos censores no ano 92 a C., conservado na obra do historiador Suetónio no século II:
"Todo o novo, que é feito contrariando o uso e os costumes dos nossos antepassados, parece não estar certo".A concluir a formação da Europa é também tributária do milagre judaico-cristão que atentas as circunstâncias é apenas enunciado. Mas é de registar a conservação do monoteísmo entre todos os politeísmos circundantes e um diálogo quase permanente com o Transcendente.
Raul da Cunha e Silva
-
Dom Fócio
Em tempos idos, D. Fócio descia da montanha, a caminho da cidade.
Ficou comovido, quando viu as ruas desertas, os automóveis parados, as lojas fechadas, uma cidade sem vida, cheia de medo. Subiu a uma rocha e assim falou:
“Tendes no vosso meio um inimigo invisível, mas poderoso que vos causará danos terríveis, se não tomardes em consideração o que vos pedi na minha última visita para defesa da mãe terra”
Agora e, pela última vez, vos digo que é preciso manter a união entre todos, cumprir religiosamente os normativos legais e recordardes que não há direitos sem deveres. Assim regressareis aos bons velhos tempos".
D. Fócio ficou em silêncio uns momentos e desapareceu junto às margens do rio.
Raul da Cunha e Silva
-
O Clube UNESCO da Maia fez 10 anos
No dia 15 de abril de 2010 procedeu-se, nos Passos do Conselho da Maia, à assinatura do protocolo que deu origem ao Clube UNESCO da Maia. Com a participação de mais de 90 associados e simpatizantes e antecedendo a assinatura do protocolo, houve um espaço de alto significado cultural e histórico:
um excelente momento musical pelo Conservatório de Música da Maia;
um registo de muito valor da História da Maia designado por: "As Terras da Maia - Percursos", apresentado por Lourdes Graça.
O protocolo foi assinado pela Dr.ª Anna Paula Ormeche, membro da Comissão Nacional da UNESCO, em representação do Sr. Embaixador Fernando Andresen Guimarães, ausente por problemas de saúde, e pelo presidente da CUMA-Clube UNESCO da Maia, Prof. Dr. Raul da Cunha e Silva.
O Presidente do Clube sintetizou na sua intervenção as dificuldades na criação do projecto, estabeleceu objetivo do Clube: na educação, na cultura e ciência, no combate ao analfabetismo e na defesa do Património. Estes serão os grandes objetivos do Clube UNESCO da Maia.
Em resposta, a Dr.ª Anna Paula Ormeche congratulou-se com a constituição do clube e revelou estar convencida do seu dinamismo e importância.
Finalmente o senhor Presidente da Câmara Municipal, eng. Bragança Fernandes, considerou uma mais valia para a Maia a existência de um clube UNESCO e disse que estava disposto a colaborar com ele.
Nos 10 anos de existência, o Clube demonstrou grande dinamismo, em vetores diferenciados:
Eventos – no total de 193;
Levantamento do Património Cultural da Maia de que resultaram 6 publicações:
Moinhos do Leça – edição da CUMA – (Clube UNESCO da Maia) – 2011;
Moinhos da Maia, no Leça e noutros cursos de água, edição da CUMA – (Clube UNESCO da Maia) – 2011;
Memórias de tempos Idos de Joaquim Antunes de Azevedo edição da CUMA – (Clube UNESCO da Maia) – 2016, 2017, 2017;
Mulheres da Maia – da Periferia à urbe Portuense, CUMA – (Clube UNESCO) da Maia – 2018.
O grupo de trabalho constituído para a comemoração dos 10 anos do Clube não pôde concretizar o seu projeto, devido às contingências que todos conhecemos. Maia, 18 de abril de 2020
Raul da Cunha e Silva
-
O sonho comanda a vida
Sonho é um conjunto de ideias e de imagens que se apresentam ao espírito durante o sono. São tão antigos como a própria humanidade, ou mesmo anteriores, porque se pensa que os animais também sonham…
A polissemia da palavra sonho permite-nos afirmar uma multiplicidade de significados como: aspiração, desejo vivo, utopia, imaginação/criação de mundos imaginários que podem ser considerados como uma aproximação às marcas da superstição, (magia, presságios, bruxaria…).
Podem ser conceitos pessoais e ocasionais que ocorrem ao longo da vida, alvos preferidos da literatura. Sonhos acordados que se identificam com aspirações, projetos de vida, programas… Há, porém, outras visões do sonho que iremos abordar.
Desde os tempos primordiais, os sonhos eram um dos meios oficialmente previstos para dar a conhecer a vontade divina ou a comunicação dos que partiram da vida.
Os antigos chineses sustentavam que os sonhos eram visitas que as almas dos mortos faziam aos vivos.
Para os egípcios, os sonhos eram mensageiros enviados pela deusa Isis dando conselhos e fazendo advertências.
Para os caldeus o sonho era uma advertência sobre o bem e o mal que os esperava. Só um dom divino e uma alta ciência permitia compreendê-los.
Toda a história da antiguidade refere a explicação dos sonhos, pelos sacerdotes nos templos ou por pitonisas como a Pitonisa de Delfos.
Sobre esta temática encontramos abundante material de estudo na literatura.
Na latina recordemos O sonho de Cipião (Cícero, De Republica, VI,9-29). O Sonho de Cipião Emiliano ocorreu durante uma visita a Masinissa, rei da Numídia, Emiliano foi recebido festivamente pelo rei, e após um banquete de longas horas recordando os feitos e virtudes de Cipião Africano. Retirou-se cansado para seus aposentos e cai logo no sono, durante o qual tem um sonho em que lhe aparece- o Africano, profetizando para o neto uma vida cheia de dificuldades na família e na carreira política.
Na literatura grega vamos trazer à colação 3 textos:
Odisseia. IV,837
Telémaco e Pisístrato chegam à Lacedemónia, terra de Menelau. Após narrar seu retorno de Troia, diz que ouviu do Velho do Mar, Proteus, que Odisseu ainda estaria vivo em uma ilha. Em Ítaca os pretendentes planeiam matar Telémaco durante o seu regresso. Atena aparece em um sonho a Penélope na figura de sua irmã, Iftime, para acalmá-la. Ilíada, I,63)
Os sonhos eram avisos que procediam diretamente das divindades Júpiter envia um sonho a Agamémnon, mandando armar os Gregos, e prometendo-lhe a vitória antes do fim do dia.Tragédia de Édipo Rei, de Sófocles
Laio, rei de Tebas é avisado por um oráculo de Delfos do nascimento de um filho que mataria o pai e casaria com a mãe (o oráculo é a resposta de uma divindade às perguntas que lhe faziam. As respostas podiam ser dadas por sinais, sacerdotes, pitonisas ou sonhos).Para evitar esta tragédia, Laio manda levar o menino de pés atados (Édipo) para o monte. Passavam por aí uns pastores que o levaram para Corinto, tendo sido adotado pelos reis da cidade. Sabendo da maldição que impendia sobre si, foge de Corinto e dirige-se a Tebas. No caminho e numa encruzilhada de 3 caminhos luta com um grupo de pessoas matando uma que era Laio, seu pai. Estava cumprida a primeira parte do oráculo de Delfos.
Ao entrar na cidade uma esfinge barrou-lhe o passo pondo-lhe uma pergunta que se não respondesse seria morto.
-Qual o animal que em criança anda a quatro, na idade adulta a duas e na velhice a 3?
-É o homem.Acertando na resposta, libertou a cidade de semelhante monstro e cumpriu a 2ª parte do oráculo de Delfos
Em compensação casou com a rainha Jocasta que era viúva. Cumprida a 3ª maldição, depois é a tragédia.
Na Bíblia são muitas as situações de sonhos. Parece que há um vaivém entre o Céu a Terra indiciado pela escada de Jacob (Génesis, XXVIII,12,13.
Jacob teve um sonho: viu uma escada apoiada na terra, cuja extremidade tocava o céu e, ao longo desta escada, subiam e desciam mensageiros de Deus.
Por cima dela estava o Senhor que lhe disse:
“Eu sou o Senhor, o Deus de Abraão, teu pai, e o Deus de Isaac Esta terra em que te deitaste dar-ta-ei assim como à tua posteridade”.Os sonhos bíblicos podem dividir-se em 3 classes:
Naturais, de origem divina, históricos Naturais:
o sonho por exemplo da mulher de Pilatos atormentada com a prisão de Jesus “Não te embaraces com a causa desse justo, porque hoje em sonhos foi muito o que padeci por seu respeito” (Mat.XXVII,19).De origem divina: os sonhos eram um dos meios para dar a conhecer ao homem a vontade divina em determinados casos.
Sonho de S. José (Mat.I,19-25
Sonhos históricos são frequentes na Bíblia GénesisXX,3 "Deus, porém, apareceu em sonhos a Abimalec, durante a noite e disse-lhe: -vais morrer por causa da mulher que raptaste, visto ela ser casada".
Na Bíblia o sonho era um meio de Deus falar com os homens
Explicação dos sonhos
Tem sido preocupação entre os povos primitivos como entre os mais cultos a explicação dos sonhos
Dificuldade em explicar a origem da imagem e o sentido oculto das palavras, dai o aparecimento de seres superiores que sabiam ler e interpretar os sonhos. As pitonisas, como a célebre Pitonisa de Delfos, as sibilas que interpretavam os oráculos dos deuses.Há estudos, livros que tentam uma explicação; há explicadores encartados uns, clandestinos outros, uns oficiais outros não.
Para Freud o sonho é um desejo recalcado, isto é não satisfeito.
O sonho é a voz do inconsciente que a psicanálise estuda, gravitando á volta das forças eróticas recalcadas.
A natureza e o mecanismo genético do sonho estão em relação com desejos não realizados e com factos sociais diversosRaul da Cunha e Silva
-
Péricles Político
O século de Péricles (V - IV a C) foi um dos períodos mais brilhantes da Grécia antiga (Atenas) na política, na arte, na filosofia, na democracia, na justiça, na educação, na liberdade cívica e transformações sociais. O calós kai ágatos , ou seja ,o belo e o bom identificavam-se assim como, na sociedade, o interesse, a honra e o medo.
Trazemos à colação este tempo, porque Péricles, um dos maiores estadistas de todos os tempos morreu de epidemia em 429 a.C. há apenas 2500 anos. Percorrendo esse tempo, chegamos aos nossos dias ao seio da corona vírus.
Em primeiro lugar, tempos de medo que se vai instalando na sociedade, impondo o confinamento, o isolamento social, o distanciamento, perturbações na saúde individual, mental e pública, no mundo do trabalho, do emprego e da economia, na convivialidade e na morte.
O "fique em casa", o não poder ir trabalhar ou estudar, a ausência dos amigos a impossibilidade de reuniões e de convívios, o medo de perder o emprego e a ruína das suas economias, a ameaça da fome e o medo da morte.
A rotina alterada, a ausência de pessoas queridas, a perda da autonomia e da liberdade de decidir ficar ou não em casa e, principalmente, a grande incerteza do futuro.Podemos questionar se as medidas que nos vão impondo, como o isolamento total ou parcial, o uso ou não de máscara, o distanciamento social ou não, as quarentenas são necessárias ou suficientes.
Num ponto todos estamos de acordo: vivemos o tempo da prudência, do medo, do pavor conforme as situações e as pessoas. A Honra.
Péricles recorda-nos que não podemos esquecer a Honra que existe na sociedade.
A Honra dos que lutam: médicos, enfermeiros, hospitais que lutam até ao limite das sua forças para salvar a vida do seu semelhante, professores que têm umo papel crucial ao serviço de uma educação inclusiva e de qualidade, funcionários, empresários, agricultores, instituições e clubes, todos quantos lutam para manter em funcionamento a sociedade.
Finalmente na retórica de Péricles o interesse. A sociedade funda-se no interesse comum e privado de todos os seus membros. É que, segundo Aristóteles, o "Homem é um animal sociável". Por isso, o Interesse é de todos, porque no meio do medo, todo lutam pelo interesse de cada um e implicitamente de todos. Há, portanto, uma relação entre deveres e direitos.
Ninguém há que tenha só direitos, ninguém há que tenha só deveres. Em tempos de pandemia, como aliás, em todos os tempos, cada ser humano tem de interiorizar e viver essa interiorização e combater por ela, ou seja, direitos e deveres são inseparáveis.
Raul da Cunha e Silva
-
Terceira idade
Ao abordar o Dia Mundial da 3ª idade (28 de outubro) recordo “As Idades do Homem”, famoso estudo de Louis Heller que refere os passos do homem, desde o seu nascimento (ou mesmo antes) até ao fim, percorrendo na sua viagem as várias etapas e solucionando os seus problemas específicos.
Desde o início, ao longo dos tempos e por necessidade de sobrevivência, foi o homem resolvendo os problemas fundamentais dos seus filhos que hoje podemos considerar solucionados. Para o fim ficaram os do fim, ou seja, os da 3ª idade, isto é, os dos pais que os filhos ainda não souberam ou puderam resolver.
Vale a pena trazer à colação a lenda dos idosos dos tempos idos, segundo a qual era costume os filhos levarem os pais que estavam velhos ao monte para lá morrerem abandonados.
Certo dia, um homem que levava o seu pai às costas, rumo ao alto de um monte, deitou-o e cobriu -o com uma capa, afastando-se em-seguida.
Passado pouco tempo, ouviu o seu pai chamar por si. Voltou para trás e viu-o triste a rasgar a capa ao meio, dizendo-lhe: - Filho, toma esta parte. Metade chega para mim. A outra será para ti, quando fores velho e os teus filhos te trouxerem para aqui.Arrependido, o filho pegou no pai e trouxe-o novamente para casa.
Assim terá terminado o costume de levar os pais para morrer abandonados no monte.
Mas foi muito longo esse tempo.
Convém recordar a situação ambivalente dos idosos que foram considerados inúteis e um peso para o grupo social, num primeiro período da história da humanidade e mais tarde sinónimo de sabedoria, de experiência e de consideração.
” Respeitemos as idades nas suas quedas e o tempo na sua voracidade” dizia Cícero.
Contudo, nos últimos tempos, a 3ª idade começa a ser um problema, ainda não resolvido com um regresso (real ou aparente) aos tempos primordiais.
A violência contra idosos patente nos órgãos de comunicação social é horripilante e pode ter várias formas desde a morte às mãos de filhos a crimes variados.
Consideremos alguns exemplos:
Violência Física
Violência Psicológica
Violência Sexual
Violência Doméstica
Violência Financeira.
Abandono
Cada uma destas violências reveste-se de muitas e variadas formas. Dado o realismo de certas narrativas, abstemo-nos de referir situações desse tipo.
Certos lares não podem ser considerados refúgio de idosos, dado o número de mortos às mãos do Corona Vírus e de outras patologias.
Mas a existência de lares evoca por associação os jardins de infância e as creches. É o alfa e o omega. Uns e outros são necessários, devem, porém, estar à altura das suas responsabilidades.
É que, as pessoas que deram a sua vida pela sociedade, verdadeiras bibliotecas vivas, não podem ter um fim de vida tão triste e criminoso.
Nenhum ser humano pode estar numa situação destas.
Há que aproveitar as experiências e a aprendizagem ao longo da vida, criando políticas de proteção social com acesso à cobertura universal de saúde.
Dizia o filósofo Tito Plauto (século I a. C.): ninguém quer morrer novo, ninguém quer ser velho. Então como é?
Raul da Cunha e Silva