No dia 8 de março, dia mundial da mulher realizou-se na Biblioteca Municipal da Maia um evento a todos os títulos notável: A Mulher da Maia/Elites no Feminino.
Ao som das guitarras do Conservatório de Música da Maia, abriu a seção o Presidente do Clube Unesco da Maia.
O sr. Presidente da Câmara, Eng. Silva Tiago louvou a ação altamente relevante do Clube Unesco da Maia, enaltecendo as qualidades cívicas do fundador do Clube,
professor Raul da Cunha e Silva.
O ponto alto da sessão foi a Homenagem a Mulheres da Maia: Mulheres de vida quase esquecidas.
Organizaram esta parte os associados Gabriel Gonçalves e Liliana Aguiar.
Foram homenageadas as seguintes Senhoras:
Alexandrina Neves Ferreira Pinto
Albina de Sousa – fala a Alexandrina
Maria Olinda da Costa Fernandes – fala filho
Zulmira Moutinho da Silva – Falam os apresentadores
Rita Moutinho Rodrigues
Zulmira Pereira
Alina Alina de Oliveira Braga
Mulheres de vida quase esquecidas
Antes de se iniciarmos este momento de enaltecimento de todas as mulheres do mundo a partir da Mulher da Maia, não poderíamos deixar de evidenciar o notável percurso
do Clube Unesco da Maia no mundo da investigação de âmbito local. São já várias as publicações que tratam temas diversos que se relacionam e destacam o material e
o imaterial do património cultural do nosso concelho.
O tema central de hoje, encontra-se relacionado com um trabalho de investigação intenso que tem vindo a ser feito nos últimos anos pelo Clube e que procura documentar
a Mulher da Maia nos seus diversos papeis. O primeiro momento da materialização deste estudo deu-se em setembro de 2018 com a publicação do livro “A Mulher da Maia:
da periferia à urbe portuense”; um segundo está a ser preparado A lavradeira rica e a Senhora.
Para além das publicações, têm sido encetados momentos pontuais, como o de hoje, para que se partilhe, com todos os interessados, o conhecimento que se vai construindo
sobre a existência e as vivências das mulheres de outrora. Partilhar conhecimento é uma das razões pelas quais hoje nos reunimos aqui, a outra é encetar um ato público
de gratidão, ou seja, homenagear aquelas que perante as adversidades da vida nunca desistiram e que lutaram, com ou sem exército e seguiram em frente. Mulheres notáveis
e de grande valor.
São sete (7) as mulheres que hoje iremos homenagear em representação de tantas outras. Sete, porque é um número mágico, com um forte poder e simbolismo. Na Alquimia,
o 7 era considerado o número da perfeição, sendo o número mais poderoso da magia. Na sabedoria clássica também estava associado à perfeição já que resulta da soma do
número 4, que representa os 4 Elementos da Natureza – Fogo, Ar, Terra e Água – com o número 3, que representa as 3 energias Divinas (no Catolicismo, Pai, Filho e
Espírito Santo).
É, portanto, o número perfeito para hoje, porque hoje é o dia daquela que é metade da humanidade e mãe da outra metade.
Foram homenageadas Maria Alina de Oliveira Braga; Alexandrina Neves Ferreira Pinto; Maria Olinda da Costa Fernandes; Rita Moutinho Rodrigues; Zulmira Moutinho da
Silva. E como as homenagens se fazem também a título póstumo homenageou-se Albina de Sousa e Zulmira Pereira.
Foram estas as notáveis homenageadas, mulheres de vida quase esquecidas, mulheres reconhecidamente de grande valor. Que permaneçam ícones de força e de exemplo para
a nossa sociedade.
Apresentamos as sínteses das comunicações:
Sexualidade feminina – entre o conflito e a ordem
palestrante Adília Fernandes (CITCEM-UP).
Optámos pelo tema da sexualidade, por nos remeter para inúmeras facetas que representam a mulher na sua condição mais vulnerável, a pobreza, associada a tantos fatores,
como o não ter acesso à educação.
Sendo assim, refiro Eva, pois os teólogos e moralistas consideram as mulheres como seus modelos, logo, como fonte do pecado, de luxúria, de doenças e do caos.
O exercício da prostituição é a expressão da sexualidade feminina condenada, oposta à que se dirige para a reprodução. Pelas suas importantes consequências morais e
sociais a prostituição convoca, até ao século XIX, medidas da Coroa e da Igreja. Sob o alarme de propagação da sífilis, exigem-se exames médicos semanais, já no século XII.
Marcadas pela infâmia, estas mulheres são segregadas como os judeus, que eram identificados pela rouelle (estrela de David, amarela) e, como os leprosos, obrigados a
usarem o guizo. Às prostitutas impunha-se um vestuário distintivo, sem um mínimo sinal de luxo e zonas assinaladas com “luz vermelha”.
A prostituição reclamada, então, como um mal necessário, não é aceite nem proibida, antes tolerada, numa tentativa de minimizar a ameaça moral, social e sanitária que
representa, pela propagação de doenças, em especial, da sífilis.
Matriculadas, as toleradas deixam de ser clandestinas. Ficam, então, submetidas a rígidas proibições e apertado controlo: não podem arrendar casa sem prévia licença policial,
também necessária para mudança de habitação ou ausência superior a cinco dias. Tal habitação é proibida junto de templos, escolas, botequins, hospedarias, tabernas e jardins.
É-lhes interdita a companhia de filhos maiores de três anos, divagarem de noite pelas ruas, passeios e praças, provocarem os transeuntes por palavras ou por acções, enfim,
ofenderem a moralidade pública. São obrigadas a controlo sanitário semanal. As toleradas infeccionadas moléstias contagiosas são hospitalizadas.
Natércia Cardeano (CUMA)
“A Lavradeira Rica da Maia”
A minha intervenção foi organizada em quatro vertentes:
Física; esposa e mãe; no seu dia a dia; o modo de trajar; e a importância do retrato de família.
No primeiro ponto e, de acordo com escritores da época, como Eça de Queirós, Camilo Castelo Branco, Luís de Magalhães, entre outros…, afirmam que a mulher da Maia do século
XIX e início do Século XX, era considerada das mulheres mais belas do norte de Portugal. Mulher bem contornada, ágil, alegre, de porte elegante, olhar natural e atraente.
Era austera e um pouco autoritária. Porém, como esposa e mãe era terna, mas gostava de exercer uma certa supremacia sobre o marido…
No seu dia a dia supervisionava, com mestria, os criados e os serviços da casa. Participava em alguns trabalhos importantes, tratava dos filhos e dos enxovais das filhas. Não
tinha muitos momentos de ócio. Raramente aparecia pelos campos.
Tinha um trajo típico da Maia. Em casa usava saia comprida, blusa clara, colete e lenço cruzado, um bonito avental, meias brancas e chinelas de verniz e, por vezes, um lenço na
cabeça atado na nuca; enfeitava-se com um cordão com uma libra ou cruz ao pescoço e brincos ou argolas.
Quando saía, trajava saia ou vestido de armur com uma barra de veludo, camisa branca de tecido delicado bordada e com rendas e casaquinho até à cinta de brocado, veludo ou astracã
enfeitado com galões. Usava meias de seda e sapatos de meio tacão. Na cabeça o tradicional chapéu maiato, mais ou menos ornamentado e ao pescoço grilhões e trancelins com enormes
corações, ou pendentes e nas orelhas grandes e bonitos brincos.
Na segunda metade do XIX, vemo-la no retrato de família.
Lourdes Graça- (CUMA)
Senhora como elemento de uma comunidade rural.
A Associada Lourdes Graça tratou o tema da Senhora como elemento de uma comunidade rural.
Colocou-a, no topo da pirâmide social, destacando-se das demais: falamos de famílias elite das Quintas.
Considerou que há dois tipos de Senhoras; as que já referimos e as que vinham à Maia aos ares, de que deu exemplo a viscondessa de Barreiros.
As quintas e os seus proprietários, uma elite distinta, são um caso particular, bem evidente na Maia.
O intimismo proporcionado destas quintas, geralmente cercadas por altos muros, que eram interrompidos pelos portões ou portais e pelos mirantes..
A Senhora nos finais do seculo XIX e princípios do século XX elevou o seu estatuto e começou a ser mote de alguns jornais. Sabemos que a proliferação da imprensa veio proporcionar
a estas Senhoras um lugar de destaque. São aceites com os seus escritos e são dadas regras para a sua postura na sociedade.
Fez a leitura de um excerto do jornal maiato da época: “O Patusco” que recomenda:
A Senhora não deve:
Passear na rua sem a criada;
Apertar muito o espartilho;
Alargar muito o passo;
Andar por casa das vizinhas;
Fazer confidências às criadas;
Comprimir muito o vestido em certo sítio.
Em jeito de conclusão diz: à Senhora não é permitido namorar à carreira; dançar no adro da Igreja e ir para a rua sem a criada.
José Augusto Maia Marques. (C.M.Maia)
MIRANTE E MULHER
O Mirante é um elemento arquitetónico ligado a uma casa, formando uma espécie de rasgo para o exterior, constituindo um local de observação.
É muito caraterístico de casas abastadas de lavradores, mas também de casas de burgueses comerciantes, por exemplo, nos finais do séc. XIX e inícios do séc. XX.
Servindo como um lugar de observação e interação, o mirante era também local de conversa e namoro.
O mirante cruzava a vida interior da casa, o microcosmos, com a vida exterior.
Nos ambientes rurais daqueles tempos, eminentemente masculinos, o mirante era dos poucos espaços domésticos prazeroso para a mulher. Era, podemos dizê-lo, o seu fortim.
O seu reduto.
A seu tempo, o associado Artur Baptista declamou um texto poético da sua autoria que a seguir se apresenta:
Amor:
Andava eu por aí a barqueirar, quando me deixei embalar pelos meus sonhos e o tema dos meus sonhos foste tu:
pelo perfil que ofereces-era desenhado com um equilíbrio generoso e com uma harmonia ainda maior que a de um arco-íris;
nada haverá mais belo que o nascer do Sol a não ser esse teu sorriso, umas vezes macio, outras com velatura, sempre a
melhor forma de acordar…
uma voz timbrada, melodiosa como o som que penetra os ouvidos para que possamos sentir um arrepio ou um afago.
E depois na transparência dos teus olhos, nesse teu olhar, sempre expressivo nunca agressivo, afirmaste pureza e limpidez de alma;
sentida à flor da pele e até ao íntimo do teu ser, a autoridade, a lucidez e o entusiasmo de quem quer que “a paz seja o
caminho” – sempre o quis crer!
Estar contigo é estar em ti. Estares comigo é saberes que renasci.
E a barqueirar continuei, com a ondulação entre a esperança do desejo e a
ânsia de que seja mais do que paixão. Será Amor? Será Amar?
Amar, eu amo os seixos, os vegetais, os seres vivos e a Humanidade!
Mas Amor não pode ser – e não é – o amar de singular para plurais.
Amor tem que ser de um singular com um outro singular.
O meu barco pára. Os meus sonhos continuam:
aos meus cinco sentidos confio o prazer;
os meus sentimentos reservo-os para a construção do nosso Amor.
Faz-me feliz. Quero que sejas o meu outro singular.
Se o quiseres ser, será sinal de que esta felicidade não será só minha.
Responde Amor
A Vereadora da Educação, Drª Emília Santos, encerrou a sessão, mostrando o seu regozijo pelo nível dos trabalhos que observou, louvando todos aqueles que neles intervieram.
Referiu individualmente todas as intervenções, considerando que no conjunto constituem uma ação de alto valor cultural. Finalizou a sua intervenção com um louvor ao Dr. Raul da Cunha e Silva,
fundador do Clube, ainda com uma significativa intervenção na atualidade.
Lourdes Graça e Raul da Cunha e Silva
NOTA sobre a realização do “site”:
O texto do poema truncado do Sr. Artur Baptista incluido no “Dia Internacional da Mulher” e emitido a 01-05-2020 estava totalmente de acordo com o que me foi transmitido.
O que agora disponibilizo é o resultado do pedido do Sr. Artur Baptista para que seja colocado no “site” o texto completo do seu poema, mas que só agora tive conhecimento.
Augusto Seabra do Amaral