No dia 17 de junho, o Clube UNESCO da Maia, CUMA, realizou um evento comemorativo dos 400 anos da Igreja do Mosteiro de Moreira da Maia.
Os temas constam do cartaz que segue. em anexo.
Iniciaram-se os trabalhos com apresentação do Dr. Rui Menezes (Técnico Superior do Gabinete de História da C.M.Maia)
História(s) que se cruzam do Mosteiro de Moreira
“O atual edifício da Igreja do Divino Salvador de Moreira foi “inaugurado” em 1622, no dia 3 de maio, dia da festa da Invenção da Santa Cruz. Conta-se que em 1758, na festa do Santo Lenho concorriam as 52 freguesias do concelho da Maia. A sua celebridade e as pessoas de maior distinção procuravam ser juízes da festa.
Quase um século depois, o Mosteiro de Moreira foi extinto e anexado ao Convento de Mafra. Seguiu-se a venda em hasta pública do edifício do Mosteiro e as suas terras. O mosteiro encontra-se classificado como Monumento de Interesse Público desde 2012. Em maio de 2022 comemoraram-se os 400 anos da Igreja do Divino Salvador. Mas existe muito mais Mosteiro e muitas histórias que contribuíram para o espaço que hoje conhecemos.
Se falamos do Mosteiro e da Igreja, não podemos esquecer a Quinta pois os três espaços formam um território onde o religioso se mistura com a arte, a literatura, a política e a história. Nos últimos 200 anos, uma família e várias gerações de homens ilustres marcaram o espaço que rodeou o Mosteiro. Falamos do jornalista, político e orador parlamentar – José Estêvão Coelho de Magalhães, o seu filho – escritor e político, Conselheiro Luís de Magalhães e o neto, o soldado – José Estevão.
Saibamos explorar o seu potencial documental, preservar o património arquitetónico, histórico e religioso, potenciar a sua localização privilegiada no contexto dos Caminhos de Santiago, de forma a honrar o esforço e memórias de todos os que contribuíram no percurso multisecular do Mosteiro”.
Rui Teles de Menezes
Maria da Luz Nolasco (Doutorada em Artes dos Media Conservadora do Museu de Aveiro – Santa Joana) tratou de forma pormenorizada a gramática do Barroco, após a contextualização temporal do monumento.
O Mosteiro / Igreja de S. Salvador de Moreira da Maia
O estatuto de mosteiro/igreja mais antigo da diocese do Porto advém do facto comprovado da sua existência no ano de 832. Estamos, por esta razão, no mais antigo mosteiro de todos os da Ordem dos Cónegos Regulares de Santo Agostinho na província de Entre Douro e Minho. A classificação como Monumento de Interesse Público ocorreu no ano de 2012.
No ano de 1060, o Mosteiro transitou de Gontão para Moreira da Maia: “… por vontade dos seus padroeiros Tructezindo Gomes e Dona Gontinha, tendo o abade D. Mendo transferido o mosteiro para Moreira, o qual tomou a invocação do Divino Salvador”.
A relíquia do Salvador, dita do Santo Lenho, é desde tempos ancestrais motivo agregador de devoção. Silenciada durante séculos, foi recuperada no local da velha pedra de ara do altar da Igreja Matriz, no ano de 1510. Foi, então, retomado o culto e o prestígio num território alargado, onde as prestações de trabalho, nas terras férteis maiatas, estimularam a sedimentação de colonos na região, e ainda, de devotos na oração. É hoje uma relíquia consagrada e protegida numa cruz de prata dourada com óculo de cristal, onde se integra o Santo Lenho da Cruz de Cristo. Estava guardada no convento de cónegos regulares de Santo Agostinho, em Moreira – Maia, encontra-se ligada ao prodígio de milagres:
“é inumerável o concurso de gente que ali concorre (…) experimentando-se continuamente os milagres que Deus Nosso Senhor ali obra, atribuindo-se também à virtude desta relíquia o prodígio de que sendo todas as freguesias circunvizinhas infestadas de muitas víboras, só nesta de Moreira não mordem, nem há memória que ali caísse nunca raio” (J. CASTRO, 1763)
Castro, J.Pedro, Mapa de Portugal, 1763, p. 214
A atual Quinta do Mosteiro, foi a cerca fundada no século XI. Este território permitiu ao Mosteiro fomentar a agricultura e o seu desenvolvimento, ensinando e promovendo o enraizamento das populações.
Ou seja, foi neste mosteiro também utilizada uma fórmula de contratação fundiária justa, com mútuos benefícios, que permitia ao agricultor a posse do prédio durante um prazo longo, de uma vida ou três vidas ou a prazo perpétuo, em troca de uma renda, ou foro anual, ou dito de enfiteuse, aforamento ou emprazamento, uma forma de valorização da agricultura.
No ano de 1562, uma nova fase, a união à Congregação de Santa Cruz de Coimbra.
Em 1834 com a extinção das ordens religiosas, ´Parte deste património é vendido em hasta pública, tendo Sª. D. Rita de Moura Miranda de Magalhães, mulher do parlamentar José Estevão, adquirido a cerca da quinta, por 30 contos, passando a residir aí com os três filhos. Desta ilustre família distinguiremos o conselheiro Luís de Magalhães que trouxe alma e saber a este lugar e a esta quinta.
O património artístico da Igreja de Salvador – o retábulo da capela-mor
A localização dos retábulos esteve diretamente relacionado com a realização dos eventos litúrgicos. Às comunidades monástico-conventuais, paróquias e irmandades ou confrarias que administravam templos autónomos impunha-se a construção do retábulo principal na capela-mor.
In Biblioteca de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian
Madeira entalhada e predominantemente dourada
1676
O Retábulo principal da igreja conventual de São Salvador, datado de 1676, Barroco Nacional, está situado na parede fronteira à porta principal da Igreja e é em madeira entalhada, predominantemente dourada. Integra grande tribuna ou Camarim com trono escalonado, peça muito usada a partir dos meados do século XVII nos retábulos principais, sendo destinado à exposição solene do Santíssimo Sacramento. O exemplo pioneiro pode ter sido o da Capela-mor da igreja do Convento de Salvador de Moreira da Maia, de Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, conforme se verifica num Relatório de 1732: “… foi esta tribuna a primeira que de talha houve nesta Província” (BRANDÃO, 1984, p. 434.)
A ordem arquitetónica é inovadora nas colunas com fuste espiralado, serpenteado de ornatos vegetalistas c/ flores envolvendo em espiral as colunas. A Planta é mandada vir de Lisboa. O entalhe é de Jerónimo da Costa, mestre portuense ou de Damião da Costa, natural de Braga (BRANDÃO, 1984, pp. 432 a 439).
O Arco triunfal, dignifica o espaço da Igreja, ergue-se, no início da nave central, partindo da capela-mor, na parede do frontispício junto ao arco triunfal, uma composição englobante da arquitetura da Igreja. Inovador e menos usual é o frontispício da nave da Igreja do Salvador ser preenchido por uma composição unitária de pedraria, incorporando o arco triunfal e os retábulos colaterais, estes últimos de madeira entalhada. A Igreja Conventual do Divino Salvador, em Moreira da Maia é, assim, o exemplar mais grandioso desta tipologia.
Órgão Histórico (de tubos), de fabrico alemão, do mestre organeiro Arp Schnitger, construído em 1701. Órgão com 12 registros, dois teclados e um fole
A segunda parte do evento personalizou três notáveis da Quinta do Mosteiro: Luís de Magalhães, sua mãe, Dona Margarida Rita de Moura Miranda e Maria da conceição Coelho de Magalhães, esposa.
Fez-se um percurso pelas ruas a que foram atribuídos os seus nomes, tendo os associados Lourdes Graça e Gabriel Gonçalves proferido, no local, uma síntese biográfica.
Sobre Luís de Magalhães, Lourdes Graça enfatizou a relação do ilustre com a geração de 70.A Quinta foi, ao tempo, lugar de encontro de muitos notáveis, amigos de Luís de Magalhães.
Particularizou duas personagens: Guerra Junqueiro e Eça de Queirós. Lembrou a Quinta de Refaldes, da autoria de Eça, descrição da Quinta. Referiu a troca de correspondência entre Dona Emília, viúva de Eça e Luís de Magalhães, a propósito da edição dos “Contos”, após a morte do autor. Referiu-se depois aoilustre Republicano, Guerra Junqueiro ainda pormenores interessantes sobre a reedição da Pátria, bem como a generosidade e altruísmo de Junqueiro, aquando do desaire de “A Monarquia do Norte”.
O associado Gabriel Gonçalves fez uma resenha histórica sobre os feitos de duas Senhoras da Quinta do Mosteiro.
Dona Rita de Moura Miranda contraiu matrimónio com o ilustre deputado e orador, José Estêvão Coelho de Magalhães, a 7 de junho de 1858, na freguesia da Sé, Porto.
Passou a viver na Quinta do Mosteiro que havia sido vendida à família Vieira de Castro e, posteriormente, adquirida por Dona Rita, pela quantia de 30 contos, segundo dados de Joaquim Antunes de Azevedo.
Teve forte e decisiva intervenção no afastamento do cemitério de Moreira da Maia, da área da Quinta do Mosteiro.
Dona Maria da Conceição Coelho de Magalhães contraiu matrimónio, a 21 de fevereiro de 1884, com o Conselheiro Luiz Cipriano Coelho de Magalhães (1859-1935) na Paróquia de Cedofeita, Porto. Após o casamento, muda de residência para a Quinta do Mosteiro, em Moreira da Maia.
Maria da Conceição é reconhecida como uma das mulheres percursoras da fotografia em Portugal. Nas palavras de António Sena “Maria da Conceição Lemos de Magalhães é um caso raro, até 1940, de uma mulher ligada à fotografia em Portugal [além de Madame Fritz, 90 anos antes]. Esclareça-se que a sua atividade se desenvolveu desde 1905 até cerca de 1915, e que não se limitou ao simples disparo de uma máquina. Pelo contrário, interessava-se pelo seu tratamento laboratorial e dedicava-se ao estudo da química fotográfica. As proximidades com a obra pictórica de uma sua contemporânea, Aurélia de Sousa (1866-1922), não são também improváveis (…). As imagens contaminam-se.”.
Fotografias publicadas:
– Interior da Aldeia: Sena, 1998, pp. 194;
– Efeitos de nuvem: Sena 1998, pp. 207;
– Na Eira: Sena 1998, pp. 217.
Revista Ilustração Portuguesa, n.º 222, de 23 de maio de 1910, página 656
José Gabriel